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27-5-2012
Du
iu spique ingliche?
O
título parece uma piada, mas não é. Ilustra o fraco conhecimento do inglês em
Cabo Verde. Nos liceus, os alunos não recebem a melhor formação e no ensino
superior, os professores têm de começar pelo básico do idioma para que os
estudantes consigam algum aproveitamento. Para um arquipélago que se quer abrir
ao mundo, a falta de comunicação numa língua cada vez mais universal poderá
representar um forte revés no desenvolvimento.
O
ensino do inglês no ensino superior é muito complicado. Há desde alunos com seis
anos de formação, alunos com dois anos de formação e alunos com nenhuma
formação. Em turmas muito grandes, isso faz com que todos os estudantes tenham
um diferente nível de inglês e dificulta o seu ensino.
"Acabamos
por herdar os problemas que vêm do liceu e da sociedade em geral",
sublinha Luís Rodrigues, coordenador do Centro de Línguas da Universidade de
Santiago. "Porque em Cabo Verde há pouco acesso ao inglês. Os programas de
televisão mais vistos são em português, principalmente as novelas brasileiras.
A música que mais se ouve é em crioulo. Portanto, o contacto com o inglês é
muito pouco, o que nos dificulta o trabalho".
O
docente conta ao Expresso das Ilhas que fez recentemente um exercício muito
simples, pediu aos alunos para narrarem a sua primeira aula de inglês e a maior
parte deles disseram que estavam com medo.
"Tenho
falado com diversas pessoas, que fizeram trabalhos sobre Cabo Verde, e segundo
consta, o cabo-verdiano tem muito medo de falhar, de errar. Quando isso se
aplica a uma língua estrangeira, esse receio aumenta. Ou seja, os alunos
colocam a eles próprios muitos entraves na aprendizagem de uma língua estrangeira".
Neste
caso, a estratégia passa por tentar mudar essa mentalidade, mudar a abordagem
que os estudantes têm ao inglês, e opta-se por uma abordagem essencialmente
comunicativa.
"Os
alunos aprendem a escrever, a ler, mas acima de tudo aprendem a saber comunicar
perante situações do dia a dia; contacto com turistas, simulações do real, para
que os alunos percebam a importância de saber falar inglês. Não é tanto para
poderem ir tirar um curso na América, não é esse inglês académico que
ensinamos, mas sim para terem uma base que lhes permita comunicar e usar a
língua no dia a dia".
Na
Universidade de Santiago todos os alunos têm inglês durante os anos do curso,
mas só no último semestre é que os alunos têm inglês mais virado para a sua
área específica, seja Business English (inglês para negócios), seja
Informática, ou Ciências Sociais, tudo porque os estudantes não têm bases que
lhes permitam começar logo pelo inglês mais específico.
Alunos chegam
mal preparados às universidades
mal preparados às universidades
Sónia
Oliveira, professora de inglês também na Universidade de Santiago, reitera que
os docentes não podem ensinar o inglês que se espera no nível universitário.
"Muitos dos alunos não tem conhecimentos e isso excluiria, logo à partida,
metade dos alunos de cada turma. Vou dar um exemplo, no ano passado comecei com
alguns exercícios orais sobre apresentações, ou seja, como se diz e pergunta o
nome das pessoas, etc., e em nenhuma turma, os alunos conseguiram acertar,
havia sempre um erro. Se os alunos não conseguem escrever correctamente essas
frases mais simples, como podemos começar com matérias mais complexas?".
As queixas repetem-se na universidade pública cabo-verdiana. Alfred Moreno, coorde-nador de Línguas, Literaturas e Culturas - Estudos Ingleses, salienta que as dificuldades dos alunos no inglês são logo visíveis nas provas de acesso à universidade. "Nos últimos anos temos deparado com um grande problema que é o fraco nível com que os alunos chegam. Se considerarmos os resultados [nos testes de ingresso], vê-se logo que a maior fatia se enquadra entre 10 e 12. Poucos estão acima desse nível. E muitos estão num patamar abaixo, na negativa. Isto é um problema. A formação em inglês não é um espaço onde o aluno vem para aprender a língua, mas sim para ter uma formação específica. Contamos que os alunos venham do liceu com um nível de formação adequado. Mas a maioria não vem com essas capacidades".
As queixas repetem-se na universidade pública cabo-verdiana. Alfred Moreno, coorde-nador de Línguas, Literaturas e Culturas - Estudos Ingleses, salienta que as dificuldades dos alunos no inglês são logo visíveis nas provas de acesso à universidade. "Nos últimos anos temos deparado com um grande problema que é o fraco nível com que os alunos chegam. Se considerarmos os resultados [nos testes de ingresso], vê-se logo que a maior fatia se enquadra entre 10 e 12. Poucos estão acima desse nível. E muitos estão num patamar abaixo, na negativa. Isto é um problema. A formação em inglês não é um espaço onde o aluno vem para aprender a língua, mas sim para ter uma formação específica. Contamos que os alunos venham do liceu com um nível de formação adequado. Mas a maioria não vem com essas capacidades".
As falhas no ensino secundário
O
diagnóstico feito pelos docentes universitários é que o inglês não é ensinado
no se-cundário da forma mais eficaz. Para Luís Rodrigues, da US, "o ensino
do inglês, no liceu, sofre do mesmo mal de muitas disciplinas; formação dos
professores e ausência de materiais. Sabemos que têm sido feitos esforços para
mudar isso, com a criação do primeiro currículo e do primeiro manual, de facto,
adaptados a Cabo Verde, mas já vem com atraso".
A
professora Sónia Oliveira reforça que é um inglês muito pouco virado para uma
comu-nicação eficaz e efectiva e mais virado para a correcção gramatical. No
fundo, o professor coloca no quadro as regras de gramática e espera que o
aluno, a partir daí, consiga falar inglês.
"Esta
é uma perspectiva datada, antiga, que vem dessa pouca formação dos professores
e essencialmente da falta de formação contínua. Como os professores não são obrigados
a fazê-la não a fazem".
Luís
Rodrigues reitera que têm tido vários contactos para dar formação aos
professores, mas são os próprios liceus a dizer que não têm forma de garantir
que os docentes par-ticipem.
"É
impressionante que não haja essa vontade por parte dos professores, nem um
mecanismo que garanta que eles lá estarão". Isto porque se em vários
países os professores precisam de ter créditos de formação, ao longo da sua
carreira, para poderem progredir, em Cabo Verde isso ainda não foi instituído.
Sónia
Oliveira explica ainda que "o grande problema é a forma como se introduz a
língua. Há erros que alunos trazem, que são perpetuados na escola, e por mais
que nós digamos que não é assim, nos testes lá aparecem sempre os mesmos erros,
que eles aprenderam há anos. A introdução na língua é fundamental, é isso que
fica".
A falta de motivação dos alunos
Outro
problema, apontam, é a motivação dos próprios alunos, que é considerada
fundamental para o ensino, em particular de uma língua estrangeira. "Em casa,
podem olhar para os apontamentos de biologia ou de história e estudá-los
sozinho", explica Luís Rodrigues, "já o inglês, como qualquer língua,
é mais difícil. Normalmente, para praticar é preciso outra pessoa, porque não
posso chegar a casa, antes do teste, e estar ali a falar comigo próprio. A
maior parte dos professores não ensina estratégias para que os alunos possam
aprender sozinhos, ou seja, passa-se tudo dentro da sala de aula e isso torna
tudo muito artificial".
Alfred
Moreno, da UNI-CV, identifica o mesmo constrangimento. "Temos um trabalho
de fundo a fazer com os alunos, porque eles não têm cultura de leitura. É pelos
trabalhos que marcamos que impomos a leitura que o aluno deve fazer. Mas, se
não fizermos assim, deparamos com alunos que têm sempre um pé atrás no acesso
às obras".
Um
dos instrumentos, considerado fundamental, para aumentar a autonomia dos alunos
será o futuro laboratório de línguas da UNI-CV que deve entrar em funcionamento
no próximo ano lectivo. "Os nossos professores dizem que sem ele o curso
fica coxo. O laboratório de língua irá ajudar o aluno a ultrapassar certas
barreiras em relação à língua, porque faz com que trabalhe a pronuncia e
aprenda novas palavras. Sem esse laboratório, o aluno resume-se ao que recebe
na sala de aula, dos professores. No laboratório, o aluno tem de aprender a
trabalhar sozinho. Isso é fundamental, porque nós trabalhamos com os alunos
dentro da sala de aula e depois disso o aluno não tem essa prática da
autonomia".
A informação
que se perde
que se perde
Como
consequência destas limitações, há todo um manancial de informação e de
formação do qual os alunos cabo-verdianos ficam afastados. "As pessoas vão
à Internet e não sentem necessidade de ir aos sites em inglês", diz Luís
Rodrigues. "Muitas vezes, o mundo que os nossos alunos conhecem é o mundo
que eles vêem.
Ao
ensinar inglês tentamos também mostrar esse outro mundo, a realidade britânica,
a realidade americana, mas os nossos alunos não estão tão interessados".
"Há
pouca vontade, por parte dos professores e das autoridades, para abrir os
horizontes e o inglês é fundamental nisso, não só por causa da língua mas de
toda uma cultura que se aprende. Quando se fala no acesso à Internet, sabemos
que cerca de 50 por cento dos conteúdos estão em inglês, portanto quem não
domina o inglês perde acesso a metade de todo o conhecimento que existe no
mundo virtual e não haver essa preocupação, para mim, é muito estranho".
A
título de exemplo, as maiores universidades norte-americanas, incluindo as mais
tra-dicionalistas como Harvard e o MIT, estão a investir mais de 60 milhões de
dólares para oferecerem cursos online, sem custos para os participantes. Aquele
que já é conhecido como ‘Campus Tsunami', nas palavras de David Brooks, no New
York Times, vai proporcionar aulas pela Internet, com os melhores professores
de cada instituição, que no final darão direito a um certificado, em vez de um
diploma.
Todo
este conhecimento, gratuito, ficará longe dos estudantes cabo-verdianos.
"É um desperdício", salienta Alfred Moreno, da UNI-CV, "porque a
língua é, de facto, uma barreira".
Da
mesma forma, o acesso a obras literárias e científicas está vedado aos alunos
cabo-verdianos. Os docentes nem sequer tentam dar livros em inglês aos
estudantes. "Era dar um tiro no pé", afirma Sónia Oliveira, "os
nossos alunos não têm ginástica suficiente para chegar lá".
"Além
que não temos essas obras literárias em Cabo Verde", completa Luís
Rodrigues,"seria possível, mas não é a nossa prioridade. Até porque é um
material muito dispendioso. Vamos agora abrir um curso de Português/Inglês e aí
sim, já haverá introdução aos estudos literários e culturais, literatura de
expressão inglesa, literatura africana de expressão inglesa. Mas serão alunos
com um perfil, que se espera, mais elevado".
Sem
esse acesso a manuais em língua inglesa, sobram ad bibliografias em espanhol ou
em português. Os professores não passam bibliografia em inglês porque os
próprios docentes não têm conhecimentos suficientes que lhes permita usar
livros ingleses. "Isso é um empecilho para todo o ensino universitário em
Cabo Verde. Há muita informação que fica de fora", sustenta Luís
Rodrigues.
O futuro do ensino
do inglês
do inglês
O
futuro passará por ir ter com os professores e dar-lhes formação. Quanto aos
alunos, para já a abordagem continuará, ou seja, usar o inglês como um auxílio
à comunicação. A médio prazo, tem de pensar-se na forma de abrir Cabo Verde ao
mundo através do conhecimento do inglês.
"Acredito
que há esse esforço para ir nessa direcção", adianta Alfred Moreno. "A
política da língua em Cabo Verde é aberta. Há dinâmica entre o país e a
cooperação francesa, entre o país e a cooperação norte-americana. Temos apoios
em termos peda-gógicos, para as universidades e os liceus, ou seja, há forma de
dar esse salto na língua. Porque sabemos que é fundamental usar o inglês para a
comunicação internacional.
Queremos
atingir esse patamar em que os profissionais cabo-verdianos possam ir a
workshops ou as conferências internacionais sem precisarem de usar o serviço de
tradução. Por outras palavras, que tenham uma interacção directa de ouvir e
falar em inglês, esse é o nosso objectivo. E acredito que possamos alcançar
esse patamar", conclui o docente.
27-5-2012,
13:33:13
Jorge Montezinho, Redacção Praia
Jorge Montezinho, Redacção Praia
Publicado por Expresso das Ilhas
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